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Análise

Andrea Zapata Carrillo

Lei Olimpia e legislação contra a violência digital na América Latina

- A América Latina carece de legislação para prevenir e erradicar a ciberviolência e o ciberassédio contra mulheres e meninas, mas há pequenos avanços em alguns países latino-americanos.

Lei Olimpia e legislação contra a violência digital na América Latina

A violência digital ou ciberviolência é o exercício de expor e divulgar imagens, áudios ou vídeos de conteúdo íntimo e sexual de uma pessoa sem o seu consentimento. A violência cibernética ameaça a integridade, a dignidade e a vida privada da vítima. Essa forma de violência é exercida por meio dos recursos tecnológicos e das redes sociais, já que estas facilitam que os agressores possam cometê-la, podendo utilizá-la anonimamente, com perfis falsos e dados irreais. Como consequência, cria-se uma barreira ao acesso seguro à comunicação digital e violam-se os direitos humanos das vítimas.

Mulheres e meninas são as que mais sofrem com a violência cibernética. A Organização Mundial da Saúde (OMS) realizou uma investigação onde estima-se que 1 em cada 10 mulheres a partir dos 15 anos já foram expostas a alguma forma de violência digital. A magnitude da situação faz com que seja um problema na agenda estadual e internacional, no entanto, é uma questão muito difícil de combater devido à falta de informação sobre a violência digital e à falta de políticas públicas que a contenham e que protejam as vítimas.

Na América Latina há uma grande falta de legislação para prevenir e erradicar a ciberviolência e o cyberbullying contra mulheres e meninas, segundo relatórios da ONU Mulheres e da Organização dos Estados Americanos (OEA). No entanto, há pequenos avanços em alguns países latino-americanos graças a ativistas, sobreviventes e organizações feministas e civis, pois obrigaram os Estados a prestar atenção tanto na adoção de novas leis quanto na construção de jurisprudência sobre o assunto.

Por outro lado, de acordo com o relatório "Ciberviolência e assédio cibernético contra mulheres e meninas no âmbito da Convenção de Belém do Pará" da OEA e da ONU Mulheres, há uma falta de harmonização nas diferentes leis e regulamentos adotados na região . , utilizam terminologias díspares sobre violência digital de gênero e formas de exercê-la, e muitas carecem de técnica legislativa adequada que assegure a incorporação de termos claros e não cumpram os princípios de exaustividade, gradualidade e proporcionalidade.

Exemplos de legislação de três países da região latino-americana são ilustrados abaixo.

Lei Olimpia (México)

O México é um dos países latino-americanos que mais mudanças em seu marco legal em relação à violência digital, desde 2014 a ativista mexicana Olimpia Corral Melo iniciou sua luta para promover reformas nos códigos penais contra a intimidade sexual depois de ser vítima da disseminação de um vídeo íntimo dela sem seu consentimento prévio.

Apesar disso, só em 2020 conseguiu aprovar um conjunto de reformas à Lei Geral de Acesso da Mulher a uma Vida Livre de Violência e ao Código Penal Federal, que visam reconhecer a violência digital e punir crimes que violem a intimidade sexual de pessoas por meio da mídia digital, também conhecida como ciberviolência. Esse conjunto de reformas é conhecido como “Lei Olímpia” em homenagem a Olímpia que lutou por tantos anos para obter justiça para ela e todas as outras.

As sanções previstas na Lei Olimpia são de três a seis anos de prisão para quem cometer o crime e multa de 500 a 1.000 Unidades de Medida e Atualização (UMA).

Argentina

No mês de julho deste ano, na Argentina, foram apresentados ao Congresso Nacional os projetos “Lei Olympia” e “Lei Belém”. Ambos os projetos visam punir a divulgação não consensual de material íntimo e sexual através das redes sociais. Eles foram apresentados pela deputada Mónica Macha junto com Olimpia Coral Melo, ativista mexicana; Elizabeth Gómez Alcorta, Ministra da Mulher, Gênero e Diversidade da Nação; o espaço para vítimas de violência digital "Ley Olimpia Argentina", e a organização "Gênero e TIC".

A lei Olimpia é a mencionada acima que nasceu no México graças à ativista Olimpia Coral Melo. No país argentino, a adoção disso implica incorporar a violência digital na lei sobre violência de gênero.

Já a Lei Belén é um projeto nascido na Argentina que busca tipificar a violência digital como crime para gerar instâncias de prevenção, investigação e sanção. O projeto leva o nome de Belén San Román, uma argentina que em 2020 foi vítima de um suicídio feminicídio após, ao término do relacionamento com seu ex-companheiro, espalhar imagens íntimas de Belén sem o consentimento dela. No entanto, pelo congresso argentino ainda não há resolução sobre a integração dos projetos na lei.

Somando-se a isso, em nível nacional existe apenas legislação sobre violência digital contra meninas, meninos e adolescentes (NNA). Especificamente, a Lei nº 26.904 no art. 131 do Código Penal, também conhecida como Lei do Grooming, que penaliza de 6 meses a 4 anos quem por qualquer meio tecnológico entrar em contato com um menor com a intenção de cometer crime contra sua integridade sexual. No nível local, o Código de Contravenções da Cidade Autônoma de Buenos Aires já incorpora como crime a divulgação não autorizada de imagens ou gravações íntimas para adultos, assédio e assédio digital, assédio sexual e representação digital.

Brasil

No Brasil, a lei penal não penaliza a veiculação não consentida de conteúdo de cunho íntimo ou sexual, limitando-se apenas a penalizar as ações de reprodução, fotografia, filmagem ou gravação por qualquer meio de conteúdo de nudez ou atos sexuais sem a autorização dos participantes.

No entanto, o país brasileiro possui um importante marco regulatório no campo dos direitos digitais, pois existem diversas leis que podem ser aplicadas em matéria de violência digital de gênero. Por exemplo, em 2018 foram criadas duas: a Lei nº 13.718 que tipifica os crimes de importunação sexual e divulgação de imagens de estupro e a Lei nº 13.642 que atribui à Polícia Federal a responsabilidade de investigar crimes digitais contra a mulher. disseminação de conteúdo que propague ódio ou aversão contra eles.

Contam também com o “Marco Civil da Internet”, que é uma iniciativa inovadora não só na região, mas no mundo por ser a primeira Declaração dos Direitos da Internet. Estabelece um sistema de responsabilidade subsidiária para provedores de serviços de Internet. O artigo 21 desta lei estabelece que as empresas provedoras de Internet têm a obrigação de remover o conteúdo íntimo em tempo razoável com a simples notificação da vítima ou seu representante legal e sem a necessidade de ordem judicial para remover o conteúdo.

Na prática

No momento, são poucos os crimes de violência digital resolvidos pelos tribunais da região. As principais razões prendem-se com a falta de jurisprudência, mecanismos de denúncia deficientes, quadros jurídicos especializados insuficientes e falta de conhecimento técnico das autoridades investigadoras para provar a violência perpetrada através das tecnologias digitais. Da mesma forma, as vítimas de ciberviolência se abstêm de depor por meio da revitimização, por vergonha e desconfiança nas autoridades judiciais, o que prejudica o processo de justiça para elas e impede a criação de políticas públicas sobre o tema.

Em suma, a violência contra a mulher persiste e evolui com o tempo, e agora os meios digitais são a ferramenta para realizá-la. É responsabilidade dos Estados garantir a segurança de seus habitantes, por isso é urgente que a jurisprudência também seja atualizada a fim de proteger qualquer vítima que sofra qualquer forma de violência digital. A atualização na América Latina tem sido lenta, até que há 5 anos foram modificados os primeiros Códigos da região; e parcial, porque poucos países latino-americanos acrescentaram a ciberviolência à sua jurisprudência. No entanto, exemplos como o do Brasil com o “Marco Civil da Internet” mostram que a região tem potencial para ser pioneira no assunto. No entanto, os Estados devem se comprometer a garantir que o espaço digital seja seguro para todos que usam as mídias digitais, levando em consideração que o uso seguro da Internet e das tecnologias faz parte de nossos direitos.

Da mesma forma, tanto as plataformas digitais quanto as redes sociais são responsáveis ​​por melhorar seu sistema de segurança, pois não possuem os meios de segurança necessários para garantir que todos os usuários desfrutem de um ciberespaço livre de violência e evitem sua propagação. Por fim, as vítimas que sofrem ou sofreram com a ciberviolência não devem ser culpabilizadas ou revitimizadas, pois isso faz com que o estigma sobre o assunto continue e impeça que as pessoas denunciem os casos às autoridades, dificultando a criação de uma nova legislação na região.

Fontes

    Procuraduría Federal del Consumidor. "La “Ley Olimpia” y el combate a la violencia digital". gob.mx, 26 de abril de 2021. https://www.gob.mx/profeco/es/articulos/la-ley-olimpia-y-el-combate-a-la-violencia-digital?idiom=es.

    European Institute for Gender Equality. Cyber violence against women and girls. 2017. Consultado el 17 de octubre de 2022. file:///C:/Users/Andrea/Downloads/cyber_violence_against_women_and_girls.pdf

    "Prevención y visibilización de la violencia cibernética contra las mujeres y niñas". Secretaria de las Mujeres de la Ciudad de México. Consultado el 17 de octubre de 2022. https://www.semujeres.cdmx.gob.mx/violencia-cibernetica-contra-mujeres#:~:text=La%20violencia%20digital%20contra%20las,de%20la%20víctima,%20de%20sus

    Cortés, Ana Karen y Jessica Matus. "Estado de la legislación en materia de violencia de género digital en Latinoamérica". Eurosocial, 2021. https://eurosocial.eu/wp-content/uploads/2022/06/Herramientas_103_Estado_de_la-legislacion_materia_de_violencia_genero.pdf.

    "Ley 26904 Ley de Grooming | Provincia de Buenos Aires". Provincia de Buenos Aires |. Consultado el 9 de noviembre de 2022. https://www.gba.gob.ar/content/ley_26904_ley_de_grooming#:~:text=Descripcion:,integridad%20sexual%20de%20la%20misma.

    Oficina Regional de ONU Mujeres para las Américas y Mecanismo de Seguimiento de la Convención Belém do Pará (MESECVI). "“Ciberviolencia y Ciberacoso contra las mujeres y niñas en el marco de la Convención Belém Do Pará". América Latina y el Caribe | ONU Mujeres – América Latina y el Caribe, 2022. https://lac.unwomen.org/sites/default/files/2022-04/Informe-Ciberviolencia-MESECVI_1Abr.pdf.

    Galarza, Florencia. "“La Ley Belén busca tipificar como delito la difusión no consentida de material íntimo”". Tiempo Judicial, 27 de julio de 2022. http://tiempojudicial.com/2022/07/27/la-ley-belen-busca-tipificar-como-delito-la-difusion-no-consentida-de-material-intimo/.

    Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. "Marco Civil de Internet | LATINNO". LATINNO | Innovations for Democracy in Latin America. Consultado el 9 de noviembre de 2022. https://latinno.net/es/case/3009/.


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Zapata, Andrea. “Ley Olimpia y legislaciones contra la violencia digital en América Latina.” CEMERI, 9 nov. 2022, https://cemeri.org/pt/art/a-ley-olimpia-legislaciones-violencia-digital-latam-kv.